Hoje – num dos tantos dias que fiquei para dormir contigo – senti que não pertencia a este espaço. Ao teu espaço. Reparei eu – enquanto o sono não vinha - que o teu quarto é azul, que a tua cama é – demasiado – grande e que nessas fotografias que vais pregando nesse quadro de cortiça eu não estou em nenhuma.
Vê lá meu amor, foi preciso o sono não me vir, para ver os quão afastados estamos nós. Ou o quanto distante eu estou do lugar onde me queria achar - o teu coração.
As paredes do meu quarto – tão desiguais das tuas - estão cobertas com os teus retratos, estão cheias de poemas que para ti rabisco e ainda odorizam à transpiração que tu deixas - quando ficas para dormir. Já viste o quão próximo eu te mantenho de mim, como me deixo penetrar de amores por ti?
Mas tu não me envolves no teu espaço meu amor, e por isso eu decidi que ao amanhecer, já não estarei aqui para te ver acordar. Os meus passos não seguirão mais os teus, porque na tua alma não me encontro eu. Tu nunca quiseste calçar o amor comigo, calçar-te nele, nós os dois. Pequeno erro meu, aperceber-me só agora, do quão longe tu caminhas.
De hoje não passa meu amor, eu cansei-me desta melancolia de alma e fugi, sem fazer barulho, fugi ou preparei-me para me ausentar de ti. Mas tu acordaste – deve ter sido do meu choro sem lágrimas - e perguntaste-me onde ia tão cedo, e eu disse, que me ia embora. Não abonaste muito significado – mais uma vez – e eu repeti-me, vou-me embora meu amor, mas não volto, os meus olhos castanhos ternurentos, cansaram-se hoje de olhar para os teus. Esses teus, de olhar tão característico, de cor clara, de confiança experimentada, cansaram os meus, mais escuros, agora de criatura tão abalada.
Respondeste-me - sem olhar para mim - que nunca cá tinha estado. E eu chorei mais uma vez, mas sem lágrimas – como se eu fosse o mar e tu areia, areia seca, por já não ver mais mar.
Só agora percebo porque é que os meus olhos me pediram para não encontrar mais os teus. Roubaste a emoção. Cansaste-os com essas tuas palavras imponderadas. E eu olhei, uma última vez, para esses teus olhos, e disse, estou cansada que nunca tenhas levantado o rosto e tenhas aberto os teus olhos - tanto quanto pudesses - para veres que os meus, estes que estiveram sempre e só abertos para ti, meu amor. Estou cansada que nunca os tenhas levantado, para veres que estava aqui. Olhei-te tempo demais e cansei-os.
E devo ter-me tornado apática, porque não senti nada - mais nada - quando fui. Nem quando me escreveste um bilhete a dizer, devias ter tido mais robustez e permanecer comigo porque foi pelo teu olhar que me apaixonei. E eu podia ter-te respondido - mas nem isso a dormência me deixou fazer - um dia a esperança morreu no meu olhar, a minha esperança em ti, e os meus olhos fecharam-se, para nunca mais abrir. Pelo menos para ti.
Mais um, mais um que podia ser um recado meu para ti.