- Estou? Tu outra vez?
- Lamento que te tenhas esquecido que um dia te entreguei o meu coração. Entreguei-to quando precisavas de uma estrada para caminhar, dias depois de me pedires para desenhar pormenorizadamente caminhos contigo. Dias depois de me pedires para te amar com todo o amor que tinha.
- …
- Foste embora cedo demais, ainda tínhamos tanto para nos mover. Mas tu foste embora, foste sem dar tempo para interromper o gesto de te dar o meu coração. O meu coração que tantas vezes te serviu de tapete: estava no mesmo sítio quando chegavas e no mesmo sítio quando abalavas. Sabes, para mim foste embora cedo demais porque eu ainda tinha mais amor para te dar. Mesmo vendo que tu interrompias os gestos de forma brusca e me deixavas cair no chão – mesmo vendo a pessoa desengraçada que te tornavas.
- Eu sinto a tua falta.
- E é nessa falta que os desconhecidos por quem passas na rua se tornaram mais familiares que eu, não é? Eles que nunca te disseram nada e eu que supostamente te disse tanto, são-te agora mais comuns que a tua própria casa, não é? Quando é que o mundo se deixou virar assim ao contrário? Quando é que deixaste de sentir amor por mim?
- Eu ainda te amo.
- E foi nesse amor que um dia te esqueceste de voltares para casa, não foi? A tua casa, o meu coração. Foi por isso que a último movimento foi uma pisada para abalares por completo? E eu que ainda deixei que o meu amor te procurasse e trouxesse para casa, fingi esquecer-me que não te havias perdido, só para te dar mais um bocadinho de amor. E eu amor, que ainda fingi que tu me amavas, depois de revelar que foste o meu melhor companheiro de movimentos, quando nos movimentamos no amor – e sem movimentos sobrepensados. Se é que te podes lembrar.
- …
- Como não te lembras que eu fui a única a enlaçar as promessas, sem conhecer que tu não sabias o valor delas, quando um dia pediste para nos perdermos nas minúcias dos movimentos - do amor - sabia tão pouco sobre o valor que tu davas às promessas. E tive – sozinha - de aprender que estas são palavras, só palavras e nada mais, que se atiram contra uma parede para ver se colam, e só deixam de ser palavras para passarem a ser promessas depois de coladas mesmo – cumpridas sabes? E tudo para saberes que eu ainda estou a enlaçada com a minha e a interpretar - desesperadamente - todos os pequenos detalhes de quando nos movimentos juntos, para tentar compreender onde (te) falhei.
- Mas olh…
- Não digas nada, porque se calhar as promessas só são promessas até encontrares outra(s).
Chamada terminada.
Chamada terminada.