domingo, julho 31

Mas e apáticos continuaremos

Quero escrever-te um bilhete de amor mas já não sei se ainda possuo amor, já não sei se isto é amor. Se calhar é amor convertido, ou sou eu a querer converte-lo, mas quero escrever-te um bilhete de amor. Acho que ainda te amo mas quero escrever-te um bilhete de amor sem amor algum, percebes? Quero entregar-te um bilhete e quero deixar-te a pensar que é um bilhete de amor mas não conter amor algum. Mas no fim eu quero que percebas que isto ainda é amor, e que depois me venhas esclarecer sobre o amor que ainda te trago. Eu acho que ainda te amo mas quero que sejas tu a dizer-mo, quero que me voltes a dizer, tu ainda me amas eu sei, porque é sinal que queres ouvir que te amo, talvez porque ainda me ames também. 

domingo, julho 24

Olá

Voar foi bom, foi realmente bom ir de encontro às nuvens e chegar perto do sol. As nuvens estavam à minha espera e chamaram o sol para me dar calor, disseram-lhe que estava a precisar de ser preenchida de cor e voltar a confiar no que move as pessoas, o calor do amor. É estranho ter gostado tanto de voar, porque de todas as vezes que subi até ao céu senti sempre medo, medo de cair e de não estar lá alguém (ele) que me amparasse a dor, medo de partir as asas ou cair de bico, é estranho sempre ter pensado o céu como um perigo, mas é só estranho porque desta vez eu deixei de ter medo para sentir calor. Se calhar não tive medo porque já ia de asas perdidas e bico para dentro, já não havia espaço para mais medos, não havia porque não há maior dor que as feridas do coração, não há. Podia cair, podia, mas já trazia golpes profundos e o céu, se me deixasse cair, ia só fazer-me uns arranhões. Mas foi a primeira vez que aproveitei mais do céu, e o céu gostou de mim, sabem? Quis que soubesse que podia vir a gostar dele, que ainda existem estrelas bonitas por toda a parte e que valem a pena ser contempladas pelo brilho que carregam, que existem realmente bocados de gente bonitos e não só um bocado, existem mais e ainda mais bonitos. E depois, depois mostrou-me o sol, o sol de perto e o sol quente, derreteu o buraco que havia congelado enquanto me deixava passar uns dias nas nuvens, para no fim me entregar outras asas, o coração vocês sabem, e para agora fazer dele uma nova casa, a seu tempo. O céu foi bom comigo e eu também, senti vontade de me voltar a querer encontrar e quão bom pode ser esta impressão de renascença, quão doce voar - mesmo que por asas de outros - pode ser. A este texto até se podia chamar esperança.

domingo, julho 17

Ate já

Tenho saudades de escrever aqui o amor, tenho. Gostava de ainda tentar falar sobre o amor sem sentir este nó na alma, gostava de ainda falar de ti para descrever o que é o amor para mim. É, tu eras a minha definição de amor, mas eu ainda não tinha conhecimento que o amor também doía, ainda não sabia que o amor também podia ser assim. Mas olhem, amanhã vou andar de avião e de uma maneira ou de outra vou voar, não com as minhas (nossas) asas mas vou voar. Vou reconfortar-me por entre as nuvens e pedir-lhes muito que o amor feliz volte para mim, para eu ainda te puder dizer o quão bonito tu és. A ti e ao céu, ao céu e aos outros. Existem por aí muitas pessoas bonitas, bonitas mesmo pelo coração lindo que carregam, existem pois, e nem devem ter conhecimento do quão bonitas são. É, eu já não sei falar sobre amor, não consigo dizer coisas bonitas, mas existem porque eu conheci-as, foram foi embora rápidas demais, eu ainda queria mais outros quatro anos ao lado de um amor feliz. O amor é bonito, só pode, toda a gente o procura, em todas as coisas há um bocadinho de amor, devia haver mais, mais amor pelas próprias asas, o coração vocês sabem, e depois mais amor a outras almas. Amanhã vou até ao céu e quando voltar conto-vos como foi, pode ser que as nuvens me tenham guardado umas novas asas. 

segunda-feira, julho 11

Eram ninhos III

- Tu não podes ir, não podes. Eu preciso de ti para me sentir bem. Para me sentir sequer.
- Eu preciso de ir. Há sempre um momento na vida em que todos precisamos.
- Tu não precisas.
- Ou não precisava. Já viste o quanto egoísta é ficar para te fazer sentir bem? Todo o ser evolui.
- O que é que isso tem haver?
- Já viste a extensão do céu, é maior que a do meu coração, pelo menos agora, é mais chamativa do que ficar com o meu coração. Neste caso com o teu, porque o meu está cortado, cortaste-me as asas lembraste? O único coração que ainda me lembro, que ainda tenho é o teu e é só um bocadinho, só um bocadinho pequeno.
- E onde é que está a evolução?
- Nenhuma alma estagna à porta de um coração fechado. Todos os seres evoluem, eu evoluo. A minha alma de pássaro. Mesmo que me tenhas aberto janelas, e com isso quero dizer colares-me as asas, já nenhuma ilusão me basta para ficar.
- Ilusão?
- É, quando visitas o meu ninho é para te deixares mais confortável, porque sempre foi assim, eu sempre te fiz voar mais alto, sempre te puxei para mais perto do sol. Sempre fui um bocado a tua luz, sempre te beijei as asas com mais carinho que todas as outras coisas.
- E onde está a ilusão nisso?
- A ilusão está quando eu penso que tu visitaste o meu ninho por mim e não por ti. Mas eu não quero mais beijar-te as asas, não quero, quero antes experimentar beijar as minhas ou um bocadinho do céu. Já não gosto que saibas onde é o meu ninho, sabias?
- Porquê?
- Porque não gosto que penses que me podes colar as asas, não podes, já não podes. Antes era a minha salvação mas agora só o céu pode ser. Não gosto de te ver, o meu coração fica sempre apertadinho.
- Porque ainda gostas da minha alma?
- Não, da tua alma não, gosto das memórias da tua alma.
- Faz diferença?
- Quando tu já não és o pássaro daquela alma faz. Já és só uma imagem da minha pequena cabeça. Não gosto que venhas ver-me porque depois fica tudo muito confuso para mim, como se o céu escurecesse e eu tivesse medo de voar, ou tentar, visto que ainda estou de asas cortadas. Não gosto que me venhas confundir as imagens, ainda gosto de guardar um bocadinho de ti.
- Então já não gostas de mim?
- Isso ainda te importa? É que já nada mudaria, eu já não trocava ficar com o céu para ficar contigo, já não, não ia suportar que me deixasses cair mais uma vez. Quiseste-me pegar, lembras-te, quisesses-te muito embalar-me e eu demorei muito a entregar-te um bocadinho meu, demorei a dar-me e quando me dei tu deixaste-me cair. Foste tu que pediste para tomar conta da minha alma de pássaro, foste tu que disseste que querias um ninho comigo, foste tu que me disseste amar-me.
- E se o céu te deixar cair também?
- É responsabilidade minha, eu é que quero o céu. Agora tu deixaste-me cair, deixaste-me cair e tu é que querias pegar em mim, tu é que insististe com as tuas promessas mentirosas, percebes a diferença?

sábado, julho 2

Eram ninhos II

- Tu para mim vais ser sempre um pássaro frágil e intocável. Devias estar naquelas caixinhas que proibiam o toque dos outros. Longe do toque mas perto da vista, muito perto, para embelezar os olhos dos outros.
- Falas assim e quase me parece amor.
- E isto é amor.
- Então o amor deixou de te chegar.
- Eu ainda não quero que toquem em ti, ainda quero ser a única alma voante a tocar em ti. Aliás eu devia poder ser o único a podê-lo para evitar que te magoassem.
- Deixaste de saber lidar bem com o amor, não foi? Lidar bem ou sentir que era bom. Deixaste de gostar de te preocupares se havia outra alma de pássaro que me podia querer tocar. O amor dá trabalho e deixaste de querer tê-lo. Mas nunca quiseste que me tocassem para não me magoar e esqueceste-te de aplicar essa regra em ti.
- Esqueci-me?
- Magoaste-me, tu magoaste-me. Já viste a ironia da situação? Nunca quiseste que me tocassem para não me manchar as asas e acabaste por ser tu a tornar os meus olhos de cristal. Acabaste por ser tu a parti-los em lágrimas. Um pássaro triste, um pássaro de almas cortadas.
- Queria ter evitado isso.
- Como quiseste evitar o meu contacto com outros céus. A dor era-me necessária para agora não me doer tanto abandonar este ninho, este ninho onde já nem queres parar para amar.
- Eu ainda quero estar por perto.
- Mas a minha alma de pássaro já não sabe se te quer ter por perto. É demais cristalizarem-me os olhos, é demais cortarem-me as asas, é demais pegarem num pássaro tão frágil e deixarem-no cair. É demais o que fizeste comigo. É demais eu tê-lo permitido por amor.
- Ainda consegues sentir amor por mim?
- Ainda não consigo deixar de me preocupar contigo. Ainda consigo ouvir o meu coração fora de mim a ansiar que passes pelo nosso ninho, ainda.
- E quando é que isso passa?
- Quando conseguir voar para fora deste ninho, mas não por tempos indefinidos, quando o conseguir sem voltar para ver se estás bem, por um tempo definitivo.
- Isso vai acontecer?
- Com o recuperar das asas vai. As minhas asas são o meu coração e tu cortaste-as quando te ausentaste do nosso ninho. Gostava do nosso ninho mais do que qualquer coisa, mais do que das minhas asas. Gostava mais de amar as tuas asas, o teu coração. Mas agora sozinha, preciso de novo das minhas asas, o nosso ninho já não chega, já não estás cá.
- Parece-me a mim que não encontras sentido para me teres amado.
- Está tudo muito obscuro, está-me muito longe da vista, muito, se é que ainda se pode olhar com uma visão tão cristalizada. Estou magoada. O sentido do amor está longe de me acalmar a dor. Estou sem asas, não penso com o coração, não o tenho. Teve sentido antes, quando o nosso ninho era a nossa casa, mas agora sou eu e os céus. Quero ser eu e os céus, quando recuperar as asas, para poder recuperar a fé no amor. Fui uma amante do amor, apaixonei-me por me ter apaixonado por ti.
- Como é que eu deixei escapar isso?
- Da mesma forma que eu deixei escapar o céu. Eu sou uma alma de pássaro e só o céu devia-me ser o suficiente. Mas nunca chega o que temos, nunca, nunca nos é bastante, somos insatisfeitos por natureza. Queremos sempre mais, mas queremos sempre o mesmo, chegamos sempre ao mesmo ponto, queremos o amor seja de que forma for.